Deliciosamente entediante
Mês passado tirei férias e passei alguns dias viajando sozinha. Várias mulheres me perguntaram como foi, querendo dicas para fazer uma jornada semelhante, mas fiquei pensando que existem algumas coisas mais importantes para se considerar antes de planejar a viagem em si.
Imagino que muitas mulheres se detenham nos pensamentos e na vontade de viajar sozinhas pensando em coisas como a segurança, mas também há uma outra questão, que é o medo da solidão. Ficar sozinha com seus próprios pensamentos pode ser um pouco assustador pra muita gente, ainda mais se estivermos procurando um pouco de paz. No dia-a-dia, sinto que preenchemos nosso tempo com muita coisa que nos distanciam do tédio, e isso é uma lástima. Então temos dois fatores pra pensar antes da viagem em si: o tédio e o prazer na própria companhia.
Desde mais nova, nunca me importei em ficar sozinha. Ia em blocos de carnaval, perdia das amigas e não procurava. Ia em festas, meu grupo decidia ir embora e eu permanecia porque queria um pouco mais. Fazia maratonas no cinema. Aos 28 anos, quando fui morar em outro estado, era sempre muito difícil combinar algo com os amigos de lá, então fazia de tudo sozinha, até sentar num bar pra beber. Não consigo mensurar quantas oportunidades teria perdido se não tivesse essa facilidade e ainda faço todas essas coisas atualmente. Meu primeiro conselho é esse: saia sozinha. Se você acha que tem algum obstáculo pessoal com isso, pode começar pela clássica ida ao cinema ou a um museu.
Fazer coisas sozinha te permite viver tudo exatamente no tempo que é melhor pra você, sem interferência da pressa ou da calma de outras pessoas. E, calma, não acho que é pra fazer tudo sempre sozinha, mas é bom se conhecer nesse aspecto também. O que você escolhe quando a decisão é apenas sua?
A parte do tédio, apesar de não precisar ser regra, também acho fundamental viver. Acredito que seja esse o lugar do descanso que revigora, quase um estado meditativo. Por favor, providencie um tempo pra você sem fazer nada (isso inclui não mexer no celular). Eu gosto de cultivar hobbies: ler, cozinhar, inventar moda com miçangas, tocar instrumentos, mas também gosto de ter momentos fazendo absolutamente nada. Deitar no sofá e ficar olhando pro teto. Às vezes em silêncio mesmo, às vezes coloco uma música tranquila. Frequentemente faço alguns exercícios de respiração profunda nesse momento, também sinto que ajuda a aliviar a mente.
Minha cabeça é um turbilhão frenético que fica multiplicando pensamentos em muitas direções e frequentemente isso me deixa aflita. A velocidade deixa tudo confuso, as ideias se atropelam. Nesses momentos, sinto que consigo desanuviar, abstrair e ser criativa. Não existe criatividade que sobreviva a uma vida sobrecarregada.
Aprender a importância do tédio também é uma recomendação que faço para uma viagem solo (ou para a vida no geral). Se você automaticamente pega o celular nos momentos livres e fica rolando a infinita linha do tempo das redes sociais, você não tá permitindo que sua cabeça descanse. Então você vai voltar das suas férias sem ter tido a paz que precisa. Uma das coisas que eu mais gosto ao viajar para a praia, por exemplo, é ficar olhando pro mar por bastante tempo, viajaaaando…
Tanto para sair sozinha quanto pra se permitir ficar entediada, acho que muita gente pode se assustar com os barulhos da própria cabeça, ficar só com seus pensamentos, a aflição de não estar se sentindo “útil” ou frear a correria diária. Mas, olha, não se vive sem esses respiros, e é importante que eles sejam incluídos na sua rotina pra não precisar disso só quando vier um burnout.
Acredito que, tendo em mente e botando em prática um pouco de solidão e um pouco de tédio, já temos aí os primeiros passos pra viajar sozinha. Depois disso vem o plano da viagem. Mas aí é assunto pra outro texto.